Os encantos de Luang Prabang (1ª parte)

Ao elaborar um roteiro sempre me vejo diante de uma encruzilhada, pois existe um imenso leque de possibilidades e ao optar por visitar um lugar, deixo de conhecer outra região. Meu coração andava apertado por não ter conhecido Luang Prabang nas duas vezes anteriores que estive no Sudeste Asiático

Palácio Real e Night Market

Luang Prabang fica no norte do Laos e é considerada Patrimônio Mundial pela Unesco. É um dos destinos que considero necessários, mesmo sem nenhuma atração turística imperdível. Fica no coração de uma região montanhosa. A cidade foi construída numa península, formada pelos rios Mekong e Nam Khan e a vegetação exuberante circunda o ambiente.

A cidade já foi a capital do reino Lane Xang, reino de um milhão de elefantes. Estava numa posição privilegiada na "rota da seda", além de ser uma região importante para o Budismo (The Prabang foi um Buda oferecido pelo Camboja). Após 1893, durante o protetorado francês (quando o país está subordinado a uma potência que decide sua política externa), o país viveu um momento turbulento e se dividiu em três reinos distintos. Luang Prabang se tornou a capital real e religiosa do rei Sisavang Vong. Apenas em 1946 Vientiane se tornou capital do Laos.

O Laos é um dos países mais pobres da Ásia, no entanto, Luang Prabang é uma cidade com um rico patrimônio arquitetônico e artístico. Tem uma paisagem urbana preservada, onde se observa a fusão da arquitetura colonial com a tradicional. Não vi miséria pelas ruas. O país exige visto de brasileiros, mas é a modalidade "visa on arrival", que é solicitado no aeroporto. A moeda é o KIP (1 REAL = 2.481 KIPS).

100.000 kips
 
A primeira tarefa foi encontrar um hotel relativamente barato (pois estava viajando sozinha) e ao mesmo tempo bem localizado e que tivesse transfer desde/para o aeroporto. A cidade tem poucas ruas, que torna possível chegar em quase todos os pontos caminhando. Em razão do valor, optei pelo Lakhangthong Boutique Hotel.

A hospedagem é bem classificada no Tripadvisor, embora tenha algumas avaliações negativas (uma delas pude vivenciar, mas tem relação com a localização, que comentarei adiante). A diária custou 90 reais, com café da manhã e transfer para o aeroporto. Apenas o transporte do aeroporto, pela pesquisa realizada, custava 20 reais cada trecho.

Enquanto ainda estava em Myanmar, recebi uma mensagem da Airsia, informando que, em razão de obras em um aeroporto, o voo teria um atraso de 1 hora. Na reserva do hotel pedia para encaminhar os dados do voo para organizar o transfer. Prontamente mandei o e-mail informando sobre a alteração. O atraso foi maior que o informado. Chegando no aeroporto, todos os passageiros correram para pegar os formulários para a emissão do visto. O trâmite durou uns 40 minutos (achei bem lento em comparação a outros países).

São três filas. Primeiro você entrega os formulários preenchidos juntamente com o passaporte (com o mínimo de 6 meses de validade) e 1 foto 5x7 (caso não tenha, basta pagar a taxa de 1 dólar para que seja escaneada do passaporte). Depois caminha para a fila seguinte e paga pelo visto. Os países possuem taxas distintas. Brasileiros pagam 30 dólares (europeus, em geral, 35 dólares) + 1 dólar que é uma taxa de serviço (tem que ser em "cash", não aceitam cartão). Para finalizar, na última fila tiram uma foto na webcam e entregam o passaporte já com o visto colado. É válido por 30 dias.

O aeroporto é ínfimo, não consegui fazer câmbio (sempre troco uma pequena quantia para não chegar na cidade sem a moeda local). Avistei uma placa com o meu nome e me apresentei. O motorista me levou até van, perguntou se era apenas uma pessoa (minha reserva era pra quarto duplo) e disse que aguardava um casal que também seguiria para o hotel. Enquanto esperava, percebi que os tuk tuks ficam do lado de fora do aeroporto, dentro estavam estacionadas apenas vans.
O aeroporto de Luang Prabang
 
O casal entrou no automóvel e seguimos para o hotel, que fica a uns 10 minutos do aeroporto. No caminho pude apreciar o belíssimo pôr do sol. Ao chegar no hotel, serviram suco natural e um prato de frutas (a hospitalidade asiática é incomparável). Enquanto organizavam o check-in, conversei com o simpático casal que morava em Londres, mas a mulher era de Bornéu. Falaram que era o momento ideal para conhecer a Inglaterra, em razão da desvalorização da moeda. Contou-me sobre a ilha que morava, que é bom destino para quem gosta de natureza.

Varanda do hotel
Vista do hotel
 
Recebemos a chave dos quartos e nos despedimos. Imediatamente perguntei se faziam câmbio no hotel. O recepcionista ligou pro chefe dele e fez por uma cotação melhor que da cidade (só depois que fui verificar). Ainda me mostrou a diferença entre a nota de 10.000 e de 100.000 kips, para que não fosse enganada na cidade. Fui levada ao meu quarto, que era acolhedor. Tinha ar-condicionado, o wi-fi funcionava, tinha duas garrafas de água no frigobar, tv. Só achei o quarto muito escuro, em razão das madeiras e o pé-direito alto da construção.
Suco e frutas na chegada



Tomei um banho, dei uma olhada no google maps, para guardar o caminho para o Mercado Noturno na memória. Deixei a chave na recepção, perguntei se era tranquilo caminhar naquele horário (20:30), peguei uma mapa desenhado (oferecido pelo hotel) e segui. As ruas próximas ao hotel não têm asfalto e são muito escuras.

Numa caminhada de uns 15 minutos (800 m) cheguei na parte principal da cidade. O Night Market funciona diariamente das 17 às 23h. São dezenas e barracas com diversos tipos de artesanato. Voltei todos os dias! Sobre a calçada ficam as barracas e no meio da rua os produtos ficam expostos sobre lonas e tapetes. No primeiro dia comprei poucas peças, pois queria saber os preços. Os produtos parecem vir, em grande maioria, da Tailândia. Os preços são mais elevados que o país vizinho, mas no mercado noturno tudo é negociável. Na primeira noite, comprei umas bolsinhas e dois elefantinhos de tecido típico daquela região (um pra mim e outro pra minha sobrinha).






Andei toda a extensão da feira umas três vezes, tomei um suco feito na hora com combinações exóticas. Dei uma olhada nas agências (abundantes no fim da rua do mercado) e avistei o escritório da Elephant Village Sanctuary, que tinha consultado previamente na internet. O tour "One Day Mahout Experience" custava 99 dólares online e no local custou 90. É uma atividade turística polêmica, no entanto, tem a melhor avaliação da cidade e foi um dos passeios mais emocionantes que já realizei, mas contarei a experiência num post apartado. 

Em posição transversal à rua do mercado noturno (Sisavangvong rd.), encontrei uma rua só com barracas de comida. Existem comidas diversas, mas predominam barracas que vendem o "buffet" por 15 mil kips. Você escolhe o que quiser (só uma vez). Os espetos de peixes e carnes são comprados separadamente. Estava tarde e fiquei na duvida se comia, pois os alimentos ficam expostos sem qualquer proteção. Quem sobrevive àquele jantar, sobrevive a tudo. Os pratos de plástico não parecem limpos e aposto que o hashi é reutilizado. Peguei pouca comida (os turistas costumam encher o vasilhame) e bebi um refrigerante (normalmente não bebo refrigerante). Inacreditavelmente, comi ali três dias seguidos... 




 
Meu pratinho
 
No início da rua do mercado, muitos tuk tuks e vans aguardam por turistas, todavia, preferi caminhar. Naquele dia a volta foi tranquila (nos dias seguintes tive problemas, apesar de considerar a cidade bem pacata).



Chegando no hotel, coloquei meu relógio para despertar 5 da manhã para ver a "Ronda das Almas", mas, ao acordar, o portão estava fechado. Tinha um turista chinês acordado. Só por volta das 6 horas alguém abriu a entrada e só consegui ver alguns monges recolhendo o alimento diário. Deixei para acompanhar o ritual na rua principal no dia seguinte.

A "Ronda das Almas" (Alms giving) é uma cerimônia autêntica do budismo em Luang Prabang. Em diversos templos que visitei havia uma placa, pedindo para os turistas não perturbarem o ritual. Existem pacotes de oferendas com arroz e doces de péssima qualidade que são vendidos por preços exorbitantes para os turistas (me ofereceram por 40 mil kips), no entanto, os moradores locais acordam às 5h da manhã para entregar a comida aos monges. Presenciei flashs disparando, turistas brigando - um estava na frente do ângulo da câmera do outro, gente correndo desesperadamente, hotéis com diversos turistas, armando um aparato para filmar e fotografar. Tentei ficar o mais distante possível, não liguei o flash e nem comprei o pacote de oferendas.






O café da manhã era escolhido no menu, novamente vejo uma desvantagem para quem viaja sozinha, pagando por um quarto duplo. A pessoa só podia escolher uma opção de prato principal, doce ou salgada, um suco, uma fruta e uma bebida quente. Ora, mas paguei o mesmo valor de quem estava comendo duas porções! Não sou esganada. Prefiro comer pão, mas fiquei com água na boca ao ver as panquecas de banana, no entanto, não abriria mão do salgado. Sempre que me deparo com essa situação, me sinto incomodada, mas nunca questionei. Alguns hotéis fazem uma pequena variação no preço individual exatamente em razão do café da manhã. O importante é que tinham baguete (provavelmente em razão passagem francesa pelo país), ovos mexidos, sucos naturais, frutas e café. Tudo muito gostoso.


Fiquei na varanda aguardando o tour me buscar às 8:00 da manhã para passar o dia com os elefantes.
 
Retornei ao hotel por volta das 16:00h e estava exausta, mas lembrei que as pessoas costumam assistir ao pôr do sol no Mount Phousi. Tomei banho e corri feito uma louca pelas ruas, no caminho, encontrei um turista inglês, que foi minha companhia até o topo da montanha



O ingresso

O Mount Phousi fica no centro da cidade e tem 100 metros de altura. Está localizado entre os dois rios, Mekong river e Nam Khan River. É um sítio de peregrinação budista, pois no topo encontramos o Wat Chom Si ("Wat" é templo). Do alto é possível ver a cidade num ângulo de 360º.


Wat Chom Si

Queria ter realizado o percurso com mais tempo, pois não pude parar para apreciar os detalhes no caminho (muitas esculturas). O sol já estava descendo naquele horário. Na metade do caminho tem um guichê que vende o ingresso por 20.000 kips. O trajeto é cansativo para uma pessoa sedentária. De repente, me deparei com um mar de pessoas e o céu estava completamente laranja. O cenário é deslumbrante. Foi difícil conseguir um espaço para fruir o espetáculo da natureza.








O caminho para retornar é mais tranquilo e termina na frente do Palácio Real, na rua do Night Market, que já estava fervilhando. Sentei por um momento, para recuperar meu fôlego, bebi água. Um grupo composto por diversos adolescentes se aproximou e queria que respondesse uma pesquisa, com perguntas sobre o local de hospedagem, quanto tempo na cidade. Sou uma pessoa desconfiada e disse que não gostaria de participar, pois ao meu redor havia milhares de chineses e nenhum deles foi abordado.

Segui para me deleitar no mercado, quando um monge me parou e pediu para responder a mesma pesquisa! Um monge! Logo não poderia ser uma cilada (fiquei envergonhada por não ter ajudado os outros meninos). Um rapaz apareceu com o crachá e disse que era o professor deles e tinha proposto uma aula de inglês interativa. Respondi ao questionário e no fim tiramos uma foto juntos. Perguntou-me se tinha dias livres para colaborar com as aulas, comparecendo um dia para ajudar com o inglês. Se soubesse dessa possibilidade, teria colocado mais um dia no meu roteiro. 











Comprei uns badulaques no mercado noturno e segui para jantar. Dessa vez pedi um peixe de rio - saindo da minha dieta vegetariana (durante a viagem). O preço era 30 mil kips, mas barganhei e consegui um por 20 mil. Como não morri no dia anterior, comi novamente a comida self-service. 




O peixe estava delicioso. Assam na brasa com capim-limão no interior.


No retorno, fiz o mesmo caminho do dia anterior, primeiro por uma avenida escura, depois por uma rua sem qualquer iluminação e com matagal assombroso na calçada, quando percebi que tinha uma motocicleta me perseguindo (vi dois relatos de homens que se hospedaram no mesmo hotel que tiveram problemas ao caminhar no período noturno) - infelizmente a mulher é mais vulnerável aos ataques, principalmente sexuais. Ouvi "lady, lady". Comecei a correr e gritar. Um dos comentários na internet dizia que os motoqueiros vendem drogas, mas eu não ia arriscar. Quando ele viu o meu comportamento, retornou e disse "no, no". Cheguei no hotel esbaforida e contei ao recepcionista, que disse "sorry". A culpa não é do hotel, que tem um serviço excelente, mas a área realmente não é favorável para solo traveler. O estranho é que a cidade não é agitada e aparentemente é bastante segura. Por outro lado, existem muitos jovens viajando pro Laos e é provável que o consumo de drogas seja grande (dizem que o paraíso deles é a cidade de Vang Vieng), abrindo espaço para traficantes.

 
Imaginem essa rua após às 22h sem qualquer iluminação?

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